11/12/2005

Lá como cá ...

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Laurent Lafforge nomeado no início de novembro (2005) para o "Haut Conseil de l'Education" demite-se no dia 21 do mesmo mês. Prestigiado matemático, professor permanente do l'Institut des Hautes Études Scientifiques, agraciado com diversas condecorações e prémios, pede a demissão, pressionado por M. Racine, presidente do HCE e por M. Seban, conselheiro do Presidente da Républica, para a Educação, em resultado da carta que lhes enviou sobre o estado da educação no país.
M. Racine considerou que "a violência apaixonada dos meus considerandos sobre o estado actual do nosso sistema educativo e sobre a responsabilidade das instâncias dirigentes da Educação Nacional, tornariam impossível um debate sereno no seio do HCE visando a construção de um consenso ou pelo menos de uma maioria sólida".
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Nessa carta, Lafforgue afirma:
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"(...) há já ano e meio que me interesso seriamente pelo estado da educação no nosso país - (...) - e cheguei à conclusão que o nosso sistema educativo público está a caminho da destruição total.
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Esta destruição é o resultado de todas as políticas e de todas as reformas conduzidas por todos os governos desde o fim dos anos 60.
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Estas politicas foram deliberadas, aprovadas, implementadas e impostas por todas as instâncias dirigentes da Educação Nacional, em especial pelos famosos experts da EN, o corpo de Inspectores (recrutado de entre os professores mais dóceis e mais submissos aos dogmas oficiais, (...) as direcções e corpo de formadores dos IUFM povoados pelos famosos didácticos e outros especialistas das chamadas ´ciências da educação` (...).
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Estas politicas inspiraram-se numa ideologia que consiste em deixar de valorizar o saber atribuindo à escola a prioridade de outros papeis que não os de instrução e de transmissão do saber, crença imposta por teorias pedagógicas delirantes, o desprezo pelas coisas simples, o desprezo pelas aprendizagens fundamentais, a recusa de ensinamentos construídos, explícitos e progressivos, o desprezo pelo conhecimento de base aliado à imposição de conteúdos confusos e desmesuradamente ambiciosos, a doutrina do aluno como “centro do sistema” devendo “construir ele próprio os seus saberes”.
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Esta ideologia conquistou igualmente as instâncias dirigentes dos sindicatos maioritários, começando pelo SGEN.
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Toda esta gente tem, hoje, um único objectivo: declinar a sua responsabilidade e mascarar, por todos os meios, a realidade do desastre.
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Não sei quais, de entre eles, (...) não participaram na loucura colectiva, nem quais os que participaram mas já deram conta das consequências dramáticas dos erros acumulados (…)"
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Compreende-se a preocupação de M. Racine!!!...
Vale a pena ler os documentos completos em:
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9 comentários:

SL disse...

E não se pode mandar fuzilar as "Ciências" da Educação?

Maria Lisboa disse...

O problema está nos “artistas” que "nunca viram a educação" e de repente vão exercer funções dirigentes. Lêem um qualquer livrito descontextualizado e depois usam-no tipo “ajude-se a si mesmo” para se salvarem da sua ignorância.

Anónimo disse...

Totalmente de acordo com f...

Anónimo disse...

A este propósito um texto interessantíssimo de um outro blog (inquietações pedagógicas:

"Luísa viu-se, no seu sonho, no centro de uma sala de paredes nuas e frias deparedes altíssimas. Um som de passos uma colega. Temos a reunião do projecto curricular. Linhas prioritárias de actuação, como trabalhamos?, construção do projecto curricular de turma. Turma? Tenho cinco turmas de Português. 150 alunos. 5 linhas prioritárias de actuação, 5 planificações de actividades, 5 construções dos projectos curriculares, 5 reuniões de grupo disciplinar vezes o número de vezes que as teremos que fazer e escrever. Tudo escrito caros Colegas! Tem que ficar escrito. se vier cá o inspector quer ver. E as áreas curriculares não disciplinares (vezes cinco) e a promoção de práticas pedagógicas que desenvolvam nos alunos métodos de trabalho (vezes cinco) e a implementação vertical e horizontal dos currículos(vezes cinco) e a articulação entre o básico e secundário (vezes cinco). A sala ia-se enchendode bocas que falavam e cada uma debitava. Eu nesta turma acho que deveríamos arranjar, com a colaboração do colega de Visual, uma exposição de sólidos platónicos, eu acho que deveríamos fazer um trabalho a partir do livro de Ilse Losa com o professor de História com ilustrações feitas pela Educ.Visual e depois faríamos uma exposição. Luisa começou a fazer quadros de dupla entrada freneticamente em que estas propostas iam entrando numa onda cada vez mais avassaladora e os quadros nunca eram demais , mesmo feitos acomputador, os seus dedos mexiam-se freneticamente e o número de bocas ia aumentando ocupando toda a sala, e a distribuição da carga horária e a distribuição do serviço docente. de repente todas as bocas se calaram e entrou um sujeito muito alto e esguio vestido de preto que falouem voz monocórdica e metálica. Reunião do Plano Anual de actividades. Um quadro com Coordenadas gerais, Objectivos, Actividades, Recursos, Calendarização eAvaliação. Há 3 coordenadas vezes 8 departamentos 1 serviço especializado de apoio educativo, 3 x 9 = 27. 27 entradas vezes 6 colunas, 162 células de texto. Agora as células ganhavam vida e engordavam engolindo cada vez mais palavras. E se tivermos que alterar isto ao longo do ano? Tudo parou. Abruptamente instalou-se um silêncio pesado. O senhor vestido de preto falou. Nada disto se altera. Isto é como um plano quinquenal só que é anual. Nada se altera e se alguma coisa o obrigar a mudar, muda-se a coisa mas oplano fica. E as bocas voltaram ao seu falar frenético. Luisa timidamente.Tenho alunos nas minhas cinco turmas que não evoluem. Aplica-se o despacho normativo 50/2005. Para cada aluno fazer um plano de recuperação, com pedagogia diferenciada na sala de aula, programas de tutoria, actividades de compensação, aulas de recuperação, actividades de ensino específico de língua portuguesa e há também os planos de acompanhamento e se for um aluno de retenção repetida então teremos que ver o processo individual do aluno,os apoios e actividades de enriquecimento curricular e planos aplicados e os contactos estabelecidos com os enccarregados de educação e o parecer dosserviços de psicologia e a proposta de encaminhamento do aluno para um planode acompanhamento e há ainda a programação individualizada e o itinerário deformação do aluno com o acordo prévio do encarregado de educação. E tudoescrito. Tenho cerca de dez alunos por turma nessas condições. Os números bailavam à frente dos olhos de Luísa 10 x 5 + 10 x 50. 100 itens, 100 folhas escritas. As 100 folhas transformavam-se em 200, em 300 e Luisa quase sufocava à medida que ia tentando manter-se à tona naquele mar de folhas. Luisa esbacejava e gritava. Mas que plano para os alunos que me chegaram à turma do 7º ano e que não sabem ler? E os que têm pais presos. E os que vivem na barraca com pais toxicodependentes? Luisa gritava cada vez mais e esbracejava freneticamente e as folhas continuavam a cair. Uma boca enormegritava-lhe. Preencher modelo 024/36/2004 da editorial do ministério e se for aluno com deficiência, modelo 098/34//2005. Atenção que neste caso temque ter a aprovação do Enc. de Educação e vai depois à Direcção regional. Lentamente a agitação foi diminuindo e Luisa, exausta, estendeu-se no cimo de uma imensa pilha de papéis. Lentamente insinuaram-se os mapas estatísticos do GIASE. A secretaria não pode fazer isto tudo. Os colegas têm que preencher isto para cada turma, número de crianças a frequentar, segundo a vez de inscrição, por idade e sexo, número de crianças a frequentar, segundo a idade e sexo e país de origem e segundo o ano de escolaridade, poridade e sexo, e segundo ano de escolaridade por língua estrangeira e por área curricular disciplinar de frequência facultativa e por educação artística e tecnológica e por grupo cultural e étnico. E os números iam fluindo por cabo para dezenas de computadores centrais onde funcionários comenormes mangas de alpaca sorridentes sem se mexerem viam entrar a torrentede dados que meticulosamente deitavam fora. Finalmente, no topo da sala, Luisa pôde olhar lá para fora e viu um aluno que olhava sem expressão para aquela torre donde esvoaçavam papéis. O aluno deteve-se ainda algum tempo e, depois, virou costas e foi-se embora. Lentamente."

João Rangel de Lima

Maria Lisboa disse...

A propósito desse texto, recebi o seguinte comentário, de um amigo:

"Luísa
sobe que sobe
a calçada..."

Rui Areal disse...

enquanto os governos forem eleitos desta forma, nada mudará. Deviamos escolher uma equipa global e não um PM. Algum de nós votaria PS se soubesse q no min iriam estar sociólogos formação e gestores de institutos de carreira (com o passado ético q se conhece)?
Não passo mais cheques em branco a ninguém. Só voto se souber quem será meu patrão!!!

Rui Areal disse...

P.S. Obviamente eu não votei Sócrates. Mas podia ter votado, pois conheço colegas que votaram e que se arrependeram. Pensaram que ele era de esquerda!

Anónimo disse...

Uma pergunta para quem souber: pode-se enviar para publicação na imprensa, textos extraídos de blogs desde que se cite a fonte? Já agora pode-se saber qual o blog donde foi retirado o texto acima citado?

Maria Lisboa disse...

O texto está em inquietações pedagógicas ... http://inquietacaopedagogica.blogspot.com/2005_12_01_inquietacaopedagogica_archive.html ... e chama-se: "Com a devida vénia a Kafka". Penso que se for com todas as referências não deve haver problema ... se eles o publicam ou não é que já é outro assunto, mas se não tentar também não fica a saber