01/09/2006

Equívocos nos Exames do 9º ano

"A taxa de reprovação e desistência no 9.º ano subiu, em 2004/2005, de 12,5% para os 19,9%. Dos 96 500 alunos inscritos, 19 mil chumbaram. Números que representam o pior desempenho em mais de uma década, arrastando todo o 3.º ciclo para a maior taxa de retenção (19,3%) desde há nove anos (ver quadro). A explicação, diz o Ministério da Educação, resume-se em duas palavras: exames nacionais."

Curiosa leitura, esta. Feita à medida para dizer entrelinhas que a culpa dos maus resultados é dos Professores. Obviamente. Evidenciado pelo facto de "nos últimos dez anos - em que o País perdeu 280 mil alunos e ganhou 15 mil professores sem grande impacto nos resultados - provam que "o problema não está tanto ao nível dos recursos" existentes como na necessidade de uma "reorganização", que passa pelo reforço do "poder e autonomia das autoridades escolares"

Donde, o Ministério explica tudo com o bode do costume. Nada se refere quanto ao número excessivo de disciplinas (quem as impôs?), nem quanto à carga horária desproporcionada (quem a determinou?) nem quanto à inexistência de recursos na escola (quem os distribui?) para fazer face às novas realidades.

Mas do lado dos sindicalistas a resposta não é grande coisa. Adriano Teixeira de Sousa, da Fenprof fez uma leitura bastante distinta destes resultados (...): [a] institucionalização [dos exames] poderia implicar uma maior selectividade na escolaridade obrigatória, o que parece confirmar-se.". Ou seja, continua a fazer-se coincidir selectividade com elitismo. É um ponto de vista, mas não o meu.

9 comentários:

Anónimo disse...

Numa linguagem de café: entre um lado e outro estamos tramados. Enquanto prossegue alegremente a guerra de alecrim e majerona entre eduqueses e anti-eduqueses e sindiatos/governo, com uma análise irrisória e "light" dos problemas da educação, continuamos a ter um problema de organização e sentido do nosso sistema. Para lá dos lugares-comuns da falta de excelência e exigência, um miúdo que entre no primeiro ano de escolaridade não tem garantias que a sua aprendizagem tenha um encadeamento que faça sentido, que as diferentes actividades, disciplinas, áreas que vai encontrar façam um todo com objectivos precisos - isto independentemente dos esforços individuais de cada um (e por isso mesmo os professores se sentem ofendidos com uma ministra que só veio acrescentar à desorientação, ajudada pelo aplauso acéfalo da camada mediático-opinativa). Esta desorientação começa logo nos objectivos do nosso sistema educativo, demasiado vagos e onde cabe tudo: da matemática à interpretação de sinais de fumo. Compreendo que haja certas necessidades sociais mas não será sensato partilhá-las entre várias instituições: câmaras, hospitais e centros de saúde, bibliotecas, etc., sem se esperar que tudo parta da escola? Ainda os objectivos: o chamado currículo nacional é uma algaraviada sem sentido onde se pede tudo e nada ao mesmo tempo: o problema mesmo é a falta de objectivos concretos e realistas que acaba por delegar toda a responsabilidade nos professores. Isto é, quem não vai corresponder ao altos e nebulosos desígnios nacionais são os professores, por incompetência, claro. Os programas nada ajudam, apenas convertem os vagos objectivos em listas gigantescas e impraticáveis de conteúdos (os professores podem até cumprir o programa mas a que custo?) Os chamados exames nacionais são, assim, um exercício pedagogicamente irrelevante mas politicamente poderoso: andamos avaliar o quê precisamente? O trabalho efectivamente feito nas escolas ou o que os avaliadores pensam que deverá ser o trabalho das escolas baseado nos objectivos de que supostamente todos temos o mesmo entendimento? É que haver exames nacionais não se resume (e aqui está o embuste) a haver uns senhores que fazem umas provas para o final do ano. Isto devia ser antecedido por uma definição rigorosa de objectivos, monitorização do trabalho nas escolas, discussão de práticas e resultados e nivelação dos exames pela fasquia mais alta relativamente ao trabalho feito. O que existe é uma demissão dos responsáveis políticos sem uma partilha justa das responsabilidades. Pelo caminho que vamos, as taxas de 30% ou mais de reprovação são quase certas, não há milagres. As escolas e os professores têm as suas culpas, mas não da maneira simplista ou pura e simplesmente troglodita que muitos comentadores (ou a própria ministra) a consideram. Apesar de alguns condicionalismos desfavoráveis (professores diferentes, p. ex.), penso que se faz pouco nas escolas para dar sentido e coerência aos ciclos de ensino, por exemplo. Um aluno entra no sétimo para aprender inglês e não há garantias de uma sequência e um acumular racional e pensado de conhecimentos. Outro dos aspectos a melhorar é o estabelecimento de um regime disciplinar mais claro e objectivo, que não seja definido individualmente por cada professor: não basta haver um regulamento que diga que nos devemos respeitar uns aos outros, mas que haja regras precisas para a entrada na sala ou para a circulação nos corredores. Não podemos esperar que a noção abstrata de comportamento razoável (o tal respeito) seja igual para todos. Acabe-se com a indisciplina português suave (nem muito grave que mereça punição severa, mas insinuante o suficiente para para destruir um trabalho consequente) e o insucesso diminuirá consideravelmente. As perspectivas não são animadoras, a tendência é que os nossos governantes tenham uma postura autoritária retrógada, isto é, que canibaliza os pequenos sucessos de maneira provinciana e que enjeita os fracassos, assacando-os por completo aos outros. Apesar das acentuadas medidas de centralização, julgo que a solução passe pelas escolas, que deverão construir uma cultura organizativa própria e sólida, que minimize os efeitos trágicos das constantes piruetas, cambalhotas e jogadas governativas.

SL disse...

Caro Pedro,

Assino por baixo.

Volte sempre!

Anónimo disse...

Espero que não assine o português apressado e cheio de gralhas :)

pedro

Anónimo disse...

Se o português dos meus alunos fosse assim apressado, tinham todos 15 como nota mínima! :)

henrique santos disse...

Sobre esta notícia e a coluna da opinião da ministra tenho também opinião no meu blog que se quiserem poderão ler.
Sobre a opinião da ministra realço o seu teor tecnocrático que faz tábua rasa da discussão sobre os fins, processos e meios e se quer centrar sobre os "resultados".
Sobre as opiniões de um sindicalista que só apareceu em frases avulsas, e que penso que me pareceram, aliás, se desenvolvidas, não destituídas de interesse, seria de salientar a ausência de espaço que os jornais não lhes concedem, em comparação com o poder.
Desejo-vos um bom ano lectivo e bloguístico

Anónimo disse...

Caro Henrique,

Aproveito para lhe dizer que respondi, por fim, ao seu comentário em http://professorsemquadro.blogspot.com/2006/07/rapidinha.html

henrique santos disse...

Caro prof24, já li a sua resposta e embora não concorde com algumas coisas penso que foi importante termos tentado esclarecer alguns pontos de vista divergentes. Até à próxima.

Unknown disse...

Excelente texto. Concordo em absoluto. A ideologia que tomou conta da escola portuguesa, confunde e relativiza tudo para poupar os seus erros evidentes!

Mas há um ponto que nunca confunde nem relativiza - a responsabilidade total e absoluta do professor.

Para os autodenominados "especialistas" da educação tentarem, cada vez com menor sucesso, esconder o ABSOLUTO fracasso do seu sistema atiram com todas as culpas para cima dos executantes - os professores.

Aquilo que mais me entristece é verificar que muitos dos docentes de hoje acreditam piamente nos tais "especialistas"! Mas, também, aquilo que me está a alimentar a esperança que um dia a escola seja, EFECTIVAMENTE, uma escola de trabalho, rigor e exigência é verificar o acordar de um número cada vez maior de professores para este verdadeiro escândalo que é a ditadura do "eduquês" e de todos os seus derivados!!

Todos os discursos ministeriais seguem de forma clara a ideologia reinante - a culpa não é do sistema, uma vez que é perfeito, mas sim de quem o executa - o professor.

Anónimo disse...

Caro Henrique Santos:
Dei um salto ao seu blog e tiro o meu chapéu. Será, sem dúvida, alguém com mais conhecimentos do que eu nestas matérias. Em parte, a diferença de interpretações que fazemos passa, penso eu, pela ausência de dados objectivos sobre a educação em Portugal: são feitos estudos científicos acerca da educação ou apenas se produz literatura avulsa? É que as minhas interpretações são meramente impressivas, ou seja, destituídas de fundamento científico. E penso que esse é o registo-padrão da maioria dos professores em Portugal.

Caro Anti-eduquês:
o risco do discurso anti-eduquês é ser entendido como um discurso fascizóide. Politicamente comprometido. Mas o diagnóstico é evidente...